Jair Raso

Atuação

• Coordenador do Serviço de Neurocirurgia e Neurologia do Hospital Unimed BH • Neurocirurgião do Biocor Instituto, Belo Horizonte, MG Membro Titular da Academia Mineira de Medicina • Membro Titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia • Membro do Congresso of Neurological Surgeons • Mestrado e Doutorado em Cirurgia pela UFMG

Especialidades

• Malformação • Artério Venosa • Aneurisma Cerebral • Cirurgia de Bypass • Revascularização Cerebral • Cirurgia de Carótida • Tumores Cerebrais • Descompressão Neurovascular • Doença de Moya-Moya Tumores da Base do Crânio Doppler Transcraniano

Contato

Alameda da Serra 400 / 404 - Nova Lima - MG (31)3264-9590 • (31) 3264-9387 jrasomd@yahoo.com.br

Substituição Sensorial e Plasticidade Cerebral

 


 

Os substitutos sensoriais são bons representantes dos maiores avanços da ciência e tecnologia aplicadas à Medicina.

Um exemplo é o implante coclear, indicado para restituir a audição em pessoas cuja surdez é devida a disfunção grave do órgão receptor auditivo, localizado na orelha interna, a cóclea.

Há dois momentos distintos na captação dos estímulos sonoros:  Primeiro, as ondas sonoras são transmitidas desde a orelha externa, membrana timpânica e ossículos da orelha média até a cóclea.  No segundo momento, células ciliadas da cóclea convertem a energia mecânica das ondas sonoras em sinais elétricos, que serão conduzidos até o cérebro pelo nervo auditivo.

Portanto, há dois tipos de surdez: A mais comum é a surdez de condução, quando a transmissão da orelha externa está prejudicada. Esse tipo de surdez pode ser contornado com uso de aparelhos auditivos.

O outro tipo de surdez, chamada neurosensorial, é devida a lesão dos receptores auditivos na orelha interna. O uso de aparelho auditivo nesse caso não resolve o problema, uma vez que as ondas sonoras não serão convertidas em sinais elétricos, única forma que o cérebro utiliza para processar o estímulo sonoro.  

Apesar de pesquisas demonstrarem ser possível estimular diretamente a cóclea, não havia tratamento para a surdez neurosensorial, até o final da década de 1970 Foi o avanço dessas pesquisas e o concurso de múltiplos especialistas de diversas áreas que tornou possível o desenvolvimento do implante coclear.

A primeira cirurgia de implante coclear foi realizada por um otorrinolaringologista australiano, Graeme Clark, em 1978.

Como funciona? Através de uma cirurgia na porção mastoide do osso temporal, atrás da orelha, um microeletrodo é inserido dentro da cóclea. A cóclea parece um caracol e os eletrodos distribuem as diversas tonalidades de sons ao longo de sua extensão. Esse microeletrodo é conectado a um processador auditivo, implantado sob a pele, abaixo da incisão cirúrgica.   Por sua vez, esse processador capta os sons de um microfone colocado atrás da orelha, semelhante aos aparelhos auditivos externos. Assim é possível transformar os sons em estímulos elétricos que são captados diretamente pelo nervo auditivo.

Inicialmente, o cérebro tem dificuldades para interpretar esses novos estímulos sonoros. Com o tempo e treinamento os estímulos transmitidos pelos microeletrodos   passam a ser interpretados pelo córtex auditivo, restaurando-se assim a capacidade de se ouvir e escutar.

I

Isto só é possível graças a grande plasticidade de nosso cérebro. Diante de um estímulo novo, diferente, nosso cérebro é capaz de alterar sua estrutura de conexões para interpretá-lo.

O feito extraordinário do engenho humano coletivo criou o implante coclear e, ao mesmo tempo, escancarou as portas da neurociência para o surpreendente mundo da plasticidade cerebral.    

 

 

 

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O Direito de Morrer

 

Becky, minha adorável vira-lata, morreu ontem. Andrea, bem mais moderna que eu, dizia que ela era caramelo. Estava conosco há cerca de 17 anos. Quando chegou, trouxe vigor e alegria contagiantes. Escolheu nossa casa e tomou posse de nossos corações.

Nos últimos meses já estava bem frágil. Cega, devido a catarata, surda e com o faro menos apurado, devido ao natural envelhecimento.

Tinha uma paraparesia leve, devido a artrose, que não a impedia de descer e subir escadas para chegar a seus lugares preferidos na casa e no quintal.

O trio de cães lá de casa era composto de dois labradores, Bertrand e Hanna, capitaneados pela chefe da matilha, Becky.

Bertrand morreu precocemente, aos 5 anos, devido a uma insuficiência renal fulminante, pra lá de esquisita.

Hanna tinha dez anos quando foi diagnosticada com um sarcoma avançado, sem possibilidade terapêutica. Sua eutanásia foi há apenas um mês.

Foi de cortar o coração a cena que passamos a presenciar quando chegávamos em casa: Becky, sentada na cama de Hanna, uivava um pranto de tristeza e saudade. Colocávamos no colo, abraçávamos e ela se acalmava.

Nesse último mês Becky envelheceu anos. Houve dias em que pensamos que ela não acordaria de um sono profundo e prolongado. Mas ela simplesmente dava o ar da graça e movia livremente com suas mazelas senis. Era um recado para Andrea e eu: preparem-se, estou partindo.

E foi assim. Pena não estarmos junto dela no derradeiro momento.

Quando comentei sobre a terminalidade de Becky com o professor Hercules Pereira Neves, da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, ele me consolou dizendo que os cachorros vivem pouco porque já chegam no mundo preparados para amar. Nós precisamos de mais tempo para aprender.

Ele tem razão. O amor de Becky conosco era incondicional. E somos muito gratos a ela pelas lições de amor.

Externo nossa gratidão também pela lição que nos deu, ao nos preparar para sua morte. Limitada e frágil, nos últimos dias Becky já não demonstrava vigor nem alegria, suas principais características. Era o tempo de morrer.  Era o direito dela.

Becky nos deixa um pouco da paz que demonstrava em seu rosto, já inerte. Vive agora nos giros de nossas boas memórias. 

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Duas Inteligências, um só propósito.

 


 

A inteligência artificial (IA) foi o tema que abordei em minha mensagem de fim de ano no Instagram (@jairraso).

Há uma inquietude em relação ao assunto, principalmente quanto à possibilidade de que um dia a IA possa substituir o cérebro humano.

Na mensagem, ressalto que o propósito da IA não é o de substituir o cérebro, mas sim o de auxiliá-lo na árdua tarefa de compilar, armazenar e evocar informações. Nisso, indiscutivelmente, a IA é imbatível. Com esse auxílio valioso, nosso cérebro estaria   liberado para outras tarefas mais construtivas.

Encerro a otimista mensagem desejando que esse ano seja o ano em que as duas inteligências, a artificial e nossa natural inteligência sejam utilizadas para a construção de um mundo melhor, mais inteligente.

Mas temos que reconhecer os riscos do uso indevido da IA e a necessidade de regulamento do seu uso.

Em informe publicitário publicado na revista Piauí de janeiro, o Youtube e Google exaltam o potencial revolucionário da IA ao mesmo tempo em que lançam princípios que devem nortear seu uso, com ética e responsabilidade.

Dentre esses princípios destacam-se o compromisso da IA em ser socialmente benéfica e o de respeitar a privacidade das pessoas.

Como a IA trabalha dados, talvez o essencial seja mesmo o princípio de se evitar vieses, mantendo-se a transparência e o controle na compilação e divulgação de seus conteúdos.

Para além de informações verídicas e corretas, o grande desafio do uso da IA é o respeito pelo direito autoral.

Como ferramenta, não há dúvida que a IA será cada vez mais incorporada ao nosso dia a dia, influenciando nossas escolhas e tomadas de decisão.

Para que a liberdade da informação elaborada por IA seja preservada, precisamos estabelecer limites. Digo precisamos porque são nossas atitudes é que farão a diferença.

Bastam pequenos passos    para nos colocar no caminho correto: checar informações antes de repassá-las, confirmar fontes da informação, dar-lhes o devido crédito e não replicar mensagens de conteúdo preconceituoso de qualquer espécie.

Esse exercício simples de rigor intelectual é um pequeno exemplo da possível materialização virtuosa do trabalho das duas inteligências: a inteligência humana alinhada à IA servindo ao propósito da construção humana.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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A morte de Rita Lee

 



Uma vez me perguntaram se eu gostava de rock e eu, açodadamente disse que não. Afinal, prefiro clássica e MPB.
Mas a morte de Rita Lee me mostrou que minha resposta sempre foi  equivocada. Adoro rock, pois sou fã incondicional de Rita Lee.

Nunca havia feito a relação de que sendo fã da Rita Lee, eu gostava de rock. Melhor ainda, de rock bem brasileiro. 
Sempre gostei dela, não só pela irreverência e humor, mas sobretudo pelas músicas. 

Em sua música Saúde, composta com seu parceiro, Roberto de Carvalho ela diz que “enquanto estou viva e cheia de graça
Talvez ainda faça um monte de gente feliz”. Eu estou no meio desse monte de gente.

Ouvir Rita Lee, me deixa feliz.

Em meu livro, Saúde, Vida Longa e Morte Súbita, lançado em 2017,  presto uma singela homenagem a ela. Transcrevo:


Ritalina 

No início de minha carreira atendia crianças. Um dia estava atendendo um menino e, como acontece com quem atende menino, a gente acaba mesmo atendendo à mãe. Ela já chegou com o diagnóstico, o que é sempre terrível.

-Meu filho é hiperativo. Tem déficit de atenção.

O diabo do menino, melhor dizendo, o anjinho não parava quieto. Vai que a mãe está certa, pensei.

Pior ainda é que esta mãe chegou também já prescrevendo o tratamento:

-Acho que ele precisa de Ritalina.

Depois de muito examinar a criança e ouvir sobre suas travessuras, diagnostiquei que estávamos diante de um artista. E sugeri uma prescrição diferente.

-Ao invés de Ritalina, que tal Rita Lee?

Arte cura artista. Arte irreverente cura mais. Mas a irreverente prescrição não deve ter sido seguida. A mãe deve ter procurado outro médico que concordasse com seu diagnóstico.

 

 


 

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Inteligência Artificial versus Ignorância Genuína

 


 

A publicação de uma carta pela organização futureoflife.org   pedindo moratória para as pesquisas relacionadas à inteligência artificial (IA) joga por terra um dos mitos relacionados ao assunto: a de que seriam apenas os ignorantes e lunáticos preocupados com o futuro da humanidade com o avanço das aplicações da IA.

A carta é assinada por cientistas, filósofos e empresários, gente de peso como Sam Altman, criador do ChatGpt; Steve Wozniak; um dos fundadores da Apple; o historiador e escritor Yuval Noah Hariri, o cientista da computação da Universidade de Berkley, nos EUA, Yoshua Bengio e o CEO da Tesla e do Twitter, Elon Musk.

 

A preocupação central da organização é com a segurança da humanidade, pois no caminho inverso do desenvolvimento da IA estão os controles de seu uso com objetivos bélicos (drones carregados com mísseis com alvos precisos) e até mesmo o controle da divulgação de notícias falsas, incluindo o risco da propagação de conhecimento sem lastro científico e definição de autoria.

Há outros mitos que precisam ser combatidos. Muitos temem que robôs conscientes irão propagar o mal pelo mundo. Na verdade, IA tem mais a ver com a internet do que com Robôs e precisa estar alinhada com os objetivos de desenvolvimento da humanidade.

Talvez o mito maior seja que a IA venha a controlar dominar o homem, na falsa crença que as máquinas possam vir a ser mais inteligentes. Isso, sim, é um mito.

Parra além dos mitos e riscos, os benefícios da IA são inequívocos. Basta ver sua incipiente incorporação na saúde, tanto no refinamento e precisão de diagnósticos, como na pesquisa científica. Pode-se dizer que a IA irá revolucionar a maneira como praticamos a medicina hoje com benefício real para os pacientes.

Não creio que uma moratória tão curta como a proposta pelos signatários do manifesto seja eficaz para atingir os objetivos. A incorporação da IA pelo homem nem é mais questão de tempo. Ela já está aqui

Tao urgente quanto o rápido desenvolvimento da inteligência artificial é o combate à ignorância genuína dos homens.

 

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Pacto pela não violência

 


Pacto pela não violência

Em outubro de 2022 manifestei minha intenção de voto convocando a neurociência para justifica-la.

O cerne da minha escolha se devia ao fato de que o governo Jair Bolsonaro pregava e praticava constantemente a violência.

Na ocasião escrevi sobre a violência:  “Ela é fruto da agressividade que está presente em todos animais e é essencial para a sobrevivência. A natureza não descarta nada. Temos em nosso cérebro os mesmos mecanismos de agressividade de outros animais. No ser humano a agressividade é expressa por    violência, seja física, verbal ou mesmo a violência da indiferença, expressa pela falta de compaixão e empatia”.

Na evolução do nosso cérebro, áreas mais recentes, notadamente o córtex pré-frontal, vão progressivamente sobrepujando áreas mais antigas, num processo que nos permitiu criar a civilização. Essas mesmas áreas respondem pelo pensamento crítico e suas conexões criam circuitos que resultam em  comportamentos e atitudes essenciais para construir um espaço de convivência em harmonia com nossos pares. Essa evolução cerebral aponta o caminho da sobrevivência da humanidade: dominar a besta que existe dentro de cada um de nós.

Arrematei a crônica de outubro informando que votaria em candidatos que “prezam e lutam pela liberdade, tolerância, compaixão, respeito às instituições e, sobretudo, pela não violência”.

Os acontecimentos desse histórico 8 de janeiro confirmam que eu estava certo. Vestindo verde-amarelo e sob o pretexto de protestar contra os resultados das eleições, bolsonaristas radicais tentaram destruir os símbolos da democracia em Brasília. Não se trata de liberdade de expressão, mas de violência pura e simples.

A reação está em curso. Há em construção um pacto mundial pela democracia que foi visivelmente atacada. As nações civilizadas já aprenderam que a democracia é o melhor modelo de governo e a violência de ontem foi um inequívoca ataque a ela. O repúdio foi imediato.   

Proponho outro pacto, esse, no íntimo de cada cidadão: um pacto pela não violência. Temos evidências de sobra para apostar nessa escolha que, ao dominar o animal que nos habita, nos levará de volta aos trilhos da construção da humanidade.


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Pensamento dogmático ameaça a Liberdade

 


 

A incapacidade de pensar não é estupidez. 

Ela pode ser encontrada em pessoas inteligentíssimas

                                                     Hanna Arendt (1906-1975)

Thinking and moral Considerations

                                                          

 

Em minha publicação de 2 de outubro expliquei como usei a neurofilosofia para minha escolha no segundo turno de nossas eleições. Volto a ela para tentar compreender a reação de familiares queridos, colegas médicos e de tantas pessoas que pletoram as redes sociais com publicações antidemocráticas e ocupam as ruas questionando o resultado das urnas.

Sei de muitas das razões que os levaram a escolher Bolsonaro. Até concordo com algumas delas. Mas sempre que eu questionava sobre os riscos dessa escolha para a democracia recebia críticas ferozes e apaixonadas.

Com a recusa de se admitir a derrota e as manifestações diante dos quartéis pedindo intervenção militar, não há mais como esconder o matiz autoritário e retrógrado desse voto.

Como explicar manifestações a favor de um golpe militar que traria de volta a ditadura? Não conseguem perceber que   livres manifestações amanhã poderão ser amordaçadas?  

Como entender o pensamento de um deputado que recebeu votação expressiva e de outros políticos, quando questionam o método eletrônico das urnas que os elegeram? Será que fraudaram a própria eleição?  

Como pessoas de bem se igualam em voz a quem responde com granadas e tiros de fuzil a uma ordem de prisão? Como parear com um representante do povo que em resposta a um insulto saca uma arma e sai à caça do desafeto? Como pessoas tão inteligentes podem ser tolerantes à exemplos de barbárie?

Hanna Arendt, no mesmo ensaio da epígrafe, atribui a Kant a distinção entre pensamento e conhecimento e nos advertiu: “precisamos da filosofia, o exercício da razão como faculdade do pensamento, para evitarmos o mal”.

A neurociência distingue o pensamento crítico, flexível do pensamento dogmático, cristalizado.

Os questionamentos colocados acima não resistiriam ao pensamento crítico. Entretanto, quando o pensamento dogmático prevalece há uma tendência a se buscar e processar informações que reforcem uma opinião prévia ou a expectativa do sujeito.

Chamo isso de teoria da gaiola, que explica inclusive muitas de nossas crenças. Há um arranjo de circuitos em nosso cérebro que processa as informações de modo a ajustá-las a conceitos familiares e ideias pré-concebidas. Essa forma cristalizada de pensar abre mão de evidências e aceita até notícias falsas, desde que reforcem o circuito engaiolado.

O problema com esse tipo de pensamento é que ele não lida bem com situações incomuns e tem dificuldade de se adaptar a um mundo de constantes mudanças.

No caso em questão, o pensamento enjaulado coloca em risco nossa liberdade. Se por um lado as manifestações pela intervenção militar são exemplos de liberdade de expressão, por outro elas escancaram um paradoxo: hoje sou livre para pedir o golpe, amanhã perco minha liberdade.  

Uma das formas de se combater o pensar dogmático é desprezar o primeiro pensamento, que é rapidamente produzido, pois está contido na gaiola. Pense de novo.  Abra a gaiola e deixe o pensamento sobrevoar sobre outras formas de pensar.

A filosofia é avessa ao pensamento que não questiona.  E como nos lembra Arendt, o pensamento é como o véu de Penélope: ele desfaz pela manhã o que havia sido tecido na noite anterior.

 

 

 

 

 

 

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